domingo, abril 17, 2011

Há mais respeito nas tascas do que no parlamento



Tribunal europeu vai receber queixa porque tempos de intervenção são muito limitados.

Veja a entrevista em vídeo

Quando foi para Assembleia da Madeira disse que iam ser sete meses de loucura. Entretanto já se passou um mês. Como é estar por dentro do sistema político regional? É absolutamente alucinante e é, de facto, uma loucura. Para quem, como eu, que desdenhava a política e os políticos é uma experiência alucinante.

É mais fácil estar de fora a criticar? É mais fácil. A vantagem de estar dentro é que é mais fácil detectar os vícios.

São muitos? São enormes. A Assembleia Legislativa regional é um 'flop'. Não existe do ponto de vista do exercício das suas competências: não legisla; não fiscaliza; os trabalhos das comissões são uma farsa, pois servem apenas para branquear a política do Governo Regional; e tem um funcionamento absolutamente medieval, bastante confrangedor e aberrante.

Medieval como? No primeiro órgão de governo próprio da Região adiam-se sessões por ausência de um deputado, por realização de congressos e altera-se profundamente a ordem de trabalho consoante os interesses de um deputado ou da maioria. Isto é uma inversão dos papéis, é algo que nem numa assembleia da 'associação amigos dos chicharros' aconteceria, porque é profundamente ilegal. Não podemos estar a discutir um tema e depois alterar-se a ordem de trabalhos e só vir a falar sobre este assunto seis meses depois. Fiz um pedido de intervenção no primeiro dia em que entrei [16 de Março] e ainda não consegui falar.

Os deputados da maioria convivem bem com este tipo de regras ou esta situação é culpa especificamente de alguém? Há muita gente ali que em privado mostra-se incomodada, mas convivem muito bem. Eu diria que nós somos actores de teatro com um papel bastante secundário e aquilo é uma tragédia grega. O orador não é ouvido por ninguém, nem pelos próprios colegas de bancada, o barulho da sala é absolutamente ensurdecedor, as pessoas chegam atrasadas ao plenário, passam o tempo agarradas aos telefones, levantam-se e ausentam-se constantemente, consultam permanentemente o Facebook. É um regabofe! Quando lá estou a sensação que tenho é que estou numa tasca, embora nas tascas as pessoas ainda se respeitem. Ali ninguém ouve ninguém, os apartes são malcriados, as pessoas não têm educação nenhuma e estou a falar da maioria [PSD] e infelizmente também de alguns deputados da oposição.

Parece uma tasca, mas é a casa da democracia. Não é não, a Assembleia Legislativa da Madeira não existe. Existe fisicamente e juridicamente, mas não exerce as suas funções. É confrangedor ver a Mesa da Assembleia regional a assistir à bagunça que são os trabalhos e não intervir. As votações são outra palhaçada. Nas votações os deputados [do PSD] nunca levantam o rabo do assento. Nós [oposição] é que temos que ter a iniciativa de nos levantarmos. Por isso, sempre que um diploma é posto em votação, acho que o PND não devia votar, devia sair da sala.

Esta semana o deputado Pedro Coelho (PSD) disse que José Manuel Coelho (PND) tinha sido o deputado mais caro, porque não tinha apresentado uma única iniciativa. Porque não avança com propostas? Porque todas as iniciativas vão para o lixo. Eu só posso avançar com uma iniciativa se ela for eficaz. O meu propósito ali dentro é denunciar isto.

Fazer propostas é uma perda de tempo? É. Há iniciativas da oposição que são válidas mas a maioria delas são 'copy paste' [copiar e colar] de legislação nacional. E não servem para nada, porque vão todas literalmente para o caixote do lixo. Aquilo funciona como um teatro e as pessoas estão ali a representar. Como as minhas iniciativas vão para o lixo, não tenho que tomar iniciativa, nem o partido que represento. As pessoas que votam no partido estão à espera que eu denuncie e para isso tenho três minutos.

É preciso ver que aquele parlamento é escolhido pela população da Madeira. Não. Eu acho que não é, porque a população da Madeira de certeza que não sabe o parlamento que tem. Também acho que as eleições são uma farsa.

As eleições não são democráticas? À partida as eleições são uma fraude, estão viciadas. Eu não confio nas mesas eleitorais. Há pessoas que estão lá que são dignas, isentas e honestas. Mas não confio e tenho razões para não confiar.

Acha que há 'chapelada'? Há 'chapelada' e da grande. Hoje em dia talvez seja mais difícil. Por isso também os resultados começam a ser diferentes. Mas não se esqueçam que havia uma altura em que os partidos da oposição não tinham representantes nas assembleias eleitorais. Mas quando falo na fraude, começa logo pelo Jornal da Madeira, pela confusão que existe entre a administração pública e os funcionários públicos. O funcionário público tem medo em votar numa alternativa porque não sabe o que vai acontecer se entra outro partido para o Governo. Há aí uma condicionante grande.

Pelo vistos vai continuar assim durante muitos anos. Não sei. A verdade é que em eleições nacionais os resultados são diferentes. Estas últimas Presidenciais foram interessantes por isso. Houve ali um trabalho, feito por meia dúzia de pessoas, que deu 40 por cento na Madeira ao candidato José Manuel Coelho, ganhando Funchal, Santa Cruz e Machico, e ficando a 5 mil votos de diferença do Prof. Cavaco Silva.

Com estas dificuldades económicas e financeiras, adivinha uma mudança nas eleições regionais de Outubro? É difícil de prever. A minha opinião e a do partido que represento é que nenhum partido da oposição devia concorrer. Seria a maior denúncia às instituições internacionais dos atropelos à democracia na Região. Seria a política da cadeira vazia.

Com a saída de José Manuel Coelho do PND, o resultado nas eleições presidenciais é um potencial que foi deitado ao lixo? Lamentavelmente, poderá ter sido. Lamento que ele tenha feito essa divergência, porque se não a tivesse feito não sei quantos deputados o PND elegeria para a Assembleia da República. Ele estaria lá, de certeza.

Queixa no Tribunal Europeu contra regras de funcionamento do parlamento madeirense

O novo deputado do PND revela que vai apresentar uma queixa no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem contra as regras de funcionamento da Assembleia Legislativa da Madeira. António Fontes garante que os deputados da oposição não conseguem exercer as suas funções com o mínimo de dignidade e de credibilidade. O que "é ilegal", assegura. O parlamentar dá o exemplo dos curtíssimos tempos de intervenção em plenário: "Se eu quiser apresentar um projecto qualquer - e não o quero - tenho 3 minutos e mais 2 minutos a seguir; depois fico sentado a ouvir o PSD falar durante 33 ou mais minutos, depois o PS a falar durante 20 minutos e não posso intervir mais. Isto é uma coisa aberrante!" Os fundamentos para essa queixa "são os direitos que estão absolutamente coarctados aos deputados eleitos, com respeito pelas maiorias". "O Regimento tem que ser equilibrado de forma a que eu possa exercer as minhas funções com critério, rigor, alguma profundidade e dignificando a Assembleia regional", acrescenta o representante do PND, que ainda sabe precisar se tal queixa avança antes do final desta Legislatura.

Opinião sobre...

PSD
Há outra fraude política que se chama Jaime Ramos, que controla tudo e mais alguma coisa e isso tem necessariamente expressão nos resultados eleitorais.

PS
Sociologicamente sabemos que qualquer alternativa de fundo tem que passar pelo PS. Tem gente lá dentro competente (Carlos Pereira é um deputado competente) para concretizar essa alternativa, lamentavelmente não me parece que o Jacinto Serrão consiga fazer isso, não consegue mobilizar, não é líder, não tem carisma.

CDU
Ideologicamente não me situo aí. Acho que tem dois deputados excepcionais, em particular o Edgar Silva, uma pessoa educadíssima, competente, muito rigoroso naquilo que faz. Como pessoa, que passei a conhecer, é excepcional.

CDS/PP
Há muitas pessoas que dizem que o CDS poderá ser a bengala do PSD. Eu acho que vai ser a cadeira de rodas do PSD e em particular do dr. Jardim.

BE
Outra boa impressão em termos pessoais que tive foi o Roberto Almada. Tem sido um companheiro ao meu lado na Assembleia e que tem me ensinado sobre os botões e como é que aquilo funciona.

MPT
O Roberto Vieira também está ao meu lado no parlamento e é uma pessoa com quem desenvolvi amizade. Politicamente o MPT não tem razão de existir porque o discurso está capturado por outras forças.

PTP
Não sei o que será. É uma incógnita o que se vai passar com esse partido. Ele [Coelho] foi politicamente comprado, ainda que tenha sido indirectamente, através de alguém que anda atrás dele.

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