GOVERNO REGIONAL PREPARA-SE PARA ENTREGAR ÁREAS DO NEGÓCIO portuário
A secretária regional do Turismo e Transportes procurou passar incólume no debate suscitado pelo PND, na Assembleia Legislativa da Madeira, em que a actividade portuária e o transporte marítimo estiverem em foco. Quis ser discreta e evasiva, mas foi enigmaticamente clara quanto à sua linha de actuação. Conceição Estudante quis reservar o anúncio das suas primeiras grandes medidas no sector para o 'seu timing político', mas o DIÁRIO apurou que os estudos e o trabalho de casa estão feitos e que a governante tem preparadas medidas que vão suscitar muita polémica.Na sua intervenção no parlamento, Estudante já deixou claro duas medidas concretas, ao assumir a vontade de normalizar as relações entre os diferentes operadores e a Autoridade Portuária através de "quadro legal e regulamentar claro e inequívoco", propósito em que deixou transparecer algum desconforto com a actual situação, em que o governo licenciou provisoriamente - há 16 anos - a operação portuária sem ter justificado esta opção.Precariedade da licençaA forma como a titular do sector admitiu a precariedade da licença do único operador, depois de confrontada por Baltasar Aguiar com o facto de a OPM e da Região não terem cumprido o que a lei exigia no licenciamento e emissão do alvará, bem como as dúvidas suscitadas pelo deputado quanto à nulidade do objecto de um licenciamento que era válido para o Porto do Funchal, mas que não se aplica ao Caniçal, bem como uma eventual caducidade desta licença, foram questões sem reposta no hemiciclo, mas que o DIÁRIO sabe que terão desenvolvimentos em breve.Do que foi possível apurar, o Governo Regional deverá anunciar a emissão de um novo licenciamento, cumprindo deste modo um requisito obrigatório, o de justificar porque razão não promove um concurso público e optou pelo licenciamento.Entre as novidades que o novo processo de licenciamento trará, está a redução drástica das taxas que a Região cobra através da Portos da Madeira SA, - sobretudo a famosa TUP-Carga, a que representa mais 1.000% do que na maioria dos portos nacionais - a partir da formalização de um licenciamento que obrigue o operador portuário, a OPM do Grupo Sousa, ao pagamento pela utilização da infra-estrutura e não apenas o direito de cobrar receitas. Novo licenciamentoO modelo que está em cima da mesa de Conceição Estudante passa pelo Governo Regional cobrar à OPM um valor correspondente à TUP-Carga (5 milhões de euros), deixando a APRAM de taxar este movimento que até não tem cobertura legal, pois a Autoridade Portuária cobra uma taxa por um serviço que não presta, quando deveria cobrar, sim, aos operadores pela utilização das suas infra-estruturas.Com um 'low-profile' que impede um debate directo com os seus oponentes, a governante deixou o essencial das suas mensagens, dando a entender que não promoverá um concurso público e consequente concessão, como é reclamado pela oposição, pois no seu entender esta não garante 'per si' uma redução dos custos.Investimento é do governoJá na parte final do seu discurso, Conceição Estudante deixou nas entrelinhas aquela que deverá ser a mais polémica proposta, pois a governante prepara-se para concessionar a privados as operações de reboque, amarração e pilotagem, tal e qual acontece nos portos nacionais, a troco do pagamento de uma verba que resulte numa receita igual à obtida actualmente pela Portos da Madeira SA.Estudante deverá evocar os mesmos argumentos com que José Sócrates prepara a privatização dos portos nacionais, reservando para a Autoridade Portuária - representada na Madeira pela APRAM SA - o papel de regulador e voltando a 'exigir' ao orçamento regional os investimentos.Esta foi, aliás, uma das mais surpreendentes e claras mensagens, quando a governante assumiu que quer a Administração de Portos da Madeira SA mais preocupada com o seu 'core-business' - sobretudo o turismo de paquetes - e menos comprometida com os investimentos em portos e outras infra-estruturas sem rentabilidade comercial.Estudante demarca-se da política dos seus antecessoresUm corte com Santos Costa e com os últimos 20 anos de política marítimo-portuária. É esta a principal leitura da recusa de Conceição Estudante em comentar o que foi feito nesta área, nos governos anteriores. A secretária regional do Turismo e Transportes não comentou as decisões que levaram à actual situação nos portos da Região, mas também não definiu metas para a sua acção futura. Em primeiro lugar, garantiu, deverão ser exploradas todas as vertentes do Tratado de Lisboa, nomeadamente o que diz respeito à aplicação do princípio da continuidade territorial e a uma eventual "discriminação positiva" das regiões ultraperiféricas. Se a governante não deu garantias sobre as medidas a implementar, do lado da oposição, o deputado do PND, responsável pela realização do debate, foi muito mais directo. Baltasar Aguiar terminou a última intervenção da manhã, com a garantia de que o seu partido irá recorrer aos tribunais, se o Governo Regional não avançar, rapidamente, para a abertura de um concurso público para as operações portuárias. "Não vamos esperar muito tempo", assegurou. Todo o debate foi marcado pelos ataques da oposição, em bloco, à situação de monopólio que beneficia a OPM e pelas acusações ao Governo Regional de manter uma situação de ilegalidade, com um operador que não dispõe de alvará e está com uma licença precária desde 1991.A falta de alvará foi muito explorada pelo deputado do PND, que recordou que esse documento deveria ter sido apresentado, pelo operador, há 15 anos, face às alterações legislativas que se verificaram.A não abertura de um concurso público para as operações portuárias, foi outro dos temas centrais do debate. Conceição Estudante considera que essa não é a "solução milagrosa" para o sector e ficou claro que, nos próximos tempos, a política do Governo Regional não vai passar por aí. As intervenções dos partidos da oposição foram marcadas por referências às "golpadas" de há 15 anos, com Carlos Pereira (PS) a acusar o GR de criar entraves sérios à entrada de outros operadores e de ter criado um "esquema" de protecção da OPM.Do lado da maioria, coube a deputados de uma segunda linha da bancada a defesa das posições 'oficiais'. A maioria optou por destacar a vertente turística do Porto do Funchal e elogiar a decisão de mudar o porto comercial para o Caniçal. Élvio Encarnação chegou a afirmar que, nas últimas décadas, o GR operou uma verdadeira "revolução" nos Portos da Região.O debate terminou com Conceição Estudante a prometer novidades para breve, depois de estarem concluídos alguns estudos. Uma intervenção que lhe valeu comparações com Santos Costa. Paulo Martins recordou que o anterior titular da pasta dos transportes também prometia "estudos e mais estudos, mas veio a revelar-se um cábula" . Dívida Carlos Pereira lembrou que a dívida relativa à reestruturação dos portos, que deveria ser paga pela OPM, acabou por ser suportada pelos madeirenses, através de uma sobretaxa imposta pelo Governo Regional.Quatro meses o CDS-PP exige que o Governo regional tome medidas para reduzir o custo médio das operações portuárias para os valores praticados no resto do país. Para isso, José Manuel Rodrigues dá um prazo de quatro anos. Máfia tem sindicalistas Confrontado com o facto de haver um sindicato que é sócio dos empresários na ETP, Leonel Nunes foi directo: "Esses não são sindicatos, esses também são a máfia e estão feitos com a gente dos portos".Taxas da APRAM Os preços praticados na Região foram um dos temas do debate, com críticas da oposição às taxas praticadas pela Administração dos Portos que se reflectem nos preços pagos pelos vários produtos.Fiasco Leonel Nunes (PCP) afirmou que a reestruturação do Porto do Funchal foi "um dos maiores fiascos da era jardinista" e que serviu, apenas, "para gastar muito dinheiro do orçamento". O PCP quer saber qual o resultado da auditoria aos portos. Clientela Paulo Martins acusa o GR de, há muito tempo, ter feito a escolha de "governar a favor de uma clientela privada". O BE identifica as medidas urgentes para os Portos: abrir um concurso público e reduzir as taxas. Guilherme presente Como o DIÁRIO noticiou, um parecer jurídico da autoria do social-democrata Guilherme Silva, que refere a ilegalidade de haver um único operador portuário, foi um dos argumentos da oposição.Custos da insularidade representam 5%As contas são de Carlos Pereira, que evocando um estudo de uma empresa holandesa garante que a Madeira foi prejudicada em 2,5 mil milhões de euros por conta dos elevados custos com os transportes marítimos, em que a insularidade tem um custo de 5% sobre o PIB. E o deputado multiplicou este por 16 anos. Máquinas custaram 2,7 milhões de eurosFoi Baltasar Aguiar quem revelou: Afinal a OPM sempre comprou, à Portos da Madeira, sete guindastes, tendo pago 2,7 milhões de euros. Um valor contestado pelo deputado, mas que Conceição Estudante não quis discutir, ignorando a avaliação feita, os 20 anos de idade do equipamento e a sua nula utilização. Os milhões pagos pelos operadoresA denúncia foi de Carlos Pereira. O operador de Leixões movimenta 282 mil contentores, factura 38 milhões e paga 5 milhões pela concessão, enquanto a OPM movimenta 73 mil contentores e factura 12 milhões (só contentores) e nada paga de concessão. Pelas contas do deputado, as taxas da OPM são 22% mais caras. Impactos do transporte na formação do custoHouve números para todos os gostos. Conceição Estudante garante que o transporte marítimo pode pesar 10% no preço dos produtos alimentares e 6% nos outros, enquanto Baltasar Aguiar e Carlos Pereira asseguram que este é superior, com os bens alimentares mais caros na Madeira em 15%.
(Publicado no Diário de Notícias - Madeira)
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